10 de ago. de 2011

COLÓQUIO SER EDITOR, SER LIVREIRO, NO BRASIL E EM PORTUGAL

Sob a curadoria e mediação do professor e ex-livreiro Aníbal Bragança (UFF/CNPq), ocorreu o dia 15 de julho de 2011, na Fundação Biblioteca Nacional, o Colóquio Ser editor, ser livreiro, no Brasil e em Portugal, cujo objetivo consistiu em trazer à discussão a formação e a identidade do editor e do livreiro (agentes culturais ou empresariais?). Para tanto, o colóquio contou com os palestrantes Mário Feijó (ECO/UFRJ), Thais Sena Schettino (IFCS/UFRJ) e Nuno Ribeiro de Medeiros (Universidade Nova de Lisboa), além dos debatedores Milena Duchiade (Livraria Leonardo Da Vinci) e Renato Casimiro Lopes (EdUERJ).




O escritor e professor Mário Feijó apresentou no colóquio a palestra intitulada “A Formação de Produtores Editoriais no Brasil”. Coordenador do curso de Produção Editorial na Escola de Comunicação da UFRJ (um dos poucos que existe atualmente no Brasil), onde ministra as disciplinas de Editoração e Edição de Livros, Feijó destaca que este curso para formação de editores tem por filosofia a formação de editores plenos, aptos a gerenciar e trabalhar em uma editora.  Ora, o maior desafio na formação de um produtor editorial apto a trabalhar com livros é prepará-lo para compreender o conteúdo que ele terá de editar com competência e arte. Como selecionar e editar conteúdo? Em vista desta questão, o professor destaca que não se pode perder de vista o conteúdo, o destinatário e o motivo da seleção (o quê, para quem, por quê?). Cada obra tem seu próprio público, que terá sempre suas exigências específicas. Editar, nestes termos, é mediar o encontro entre o livro e seu leitor, levando em consideração não apenas a adequação da materialidade do produto, mas também, e principalmente, o valor daquele conteúdo para o público a que se destina.  Por isso, Feijó enfatiza que o sucesso de um editor depende sobretudo da maneira como ele se relaciona com o conteúdo (donde ser indispensável que o mesmo seja também um leitor assíduo do conteúdo que ele edita). E ao ser mediador entre autores e leitores, o editor é, por conseguinte, mediador entre autores e livreiros. Ao editor, é igualmente importante ter um diálogo permanente com o comercial, com a ponta da cadeia que leva o livro ao leitor — o livreiro —, quer pela questão da distribuição, quer pelos bons conselhos que um bom livreiro pode dar tanto na catalogação quanto na seleção de conteúdos. À guisa de conclusão, o professor da ECO lança uma questão  sobre a questão da competência e maestria exigida do editor: “É realmente possível ensinar isso na escola?” — Ora, há coisas que a sala de aula não ensina. A profissionalização depende não apenas dos estágios e da universidade, mas também do próprio editor — ele precisa ser, para sempre, um autodidata.
Thais Sena Schettiono, doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Sociologia do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da UFRJ, por seu turno, pensando na atividade do livreiro hoje, diante da emergência de novas tecnologias de comunicação, trouxe à mesa de discussão a palestra “Comércio e cultura: a identidade profissional do livreiro”. A palestrante destaca que no universo de estudos sobre o livro, ainda são poucos os que se debruçaram sobre o papel do livreiro como um profissional fundamental na cadeia produtiva do livro. Ainda que atuem como intermediários culturais, afirma Schettiono, a imagem social do livreiro está mais próxima da de um comerciante, embora eles acreditem que não vendem somente livros, mas conselhos sobre o universo editorial. Tal imagem social do livreiro como comerciante se explica parcialmente pela atual inexistência de regulamentação da profissão no Brasil. Não há uma formação acadêmica para o livreiro; há apenas cursos pontuais e de curta duração oferecidas por certas instituições, sobretudo particulares. E, por isso, sem uma instituição acadêmica que contribua para a formação de sua identidade, oficialmente, o livreiro aparenta estar mais próximo do comerciante do que do editor ou do produtor cultural. Sem uma instituição, a formação do livreiro se dá na prática: por um lado, é-lhe exigida uma aproximação, uma familiaridade com os livros desde cedo; por outro, é-lhe exigida a prática de se estar na livraria, pois somente na prática de uma livraria (emulando o modo de organização desse ou daquele livreiro particular) o futuro livreiro entra em contato com as informações importantes, que farão dele alguém capaz de indexar informação e oferecê-las ao leitor.
 Por fim, Nuno Medeiros (Universidade Nova de Lisboa) traz d’além-mar a palestra “Ser editor em Portugal no século XX: tensões e transformações”. Ora, Medeiros trata em sua palestra de três características relacionadas com a identidade dos editores portugueses. O primeiro aspecto, histórico, traz o editor como que pertencendo a um clube de cavalheiros. Nuno destaca que o início da atividade de editor está relacionado a uma visão dessa atividade como um ofício nobre — o ofício de um clube de cavalheiros (que se contrapõe a uma nostalgia contemporânea em relação ao antigo e, por assim dizer, “nobre” ofício do editor). Havendo aí uma transição que faz do discurso de vocação (do cultural pelo cultural) para o discurso que vê o livro como produto comercial. No segundo aspecto, vale dizer, que se entra na tensão entre cultura e comércio; tensão esta que alimentou perpétuos debates e polarizações — é que os editores, destaca Medeiros, são agentes de um campo contraditório. E, por fim, o terceiro aspecto diz respeito à constantemente alegada crise da edição: problema estrutural ou retórico?  Filho de livreiros, animador de leitura e estudioso do livro, Nuno relata com refinado senso de humor que para os editores a editoração sempre está em crise. E explica: é que no lexema ‘crise’ os editores se reconhecem e constroem a identidade de grupo, a identidade do editor.
Às palestras apresentadas por Feijó, Schettino e Medeiros seguiu-se um debate que contou com a presença de Renato Casimiro (Coordenador de publicações da UdUERJ) e de Milena Duchiate (livreira e filha de livreiros — sua mãe é Dona Vanna Piraccini —, responsável pela Livraria Leonardo da Vinci). Dentre as muitas questões colocadas, destacam-se: Por que o descompasso entre a ampliação das editoras e a minguação das livrarias e distribuidoras? Por que da ausência de diálogo entre livreiros e editores? Serão no futuro os livreiros tão somente comerciantes? — Ora, não podem ser os livreiros apenas comerciantes. Bons livreiros são prestadores de serviços, são como que guias nas sendas dos livros; com seus repertórios de informações, eles possibilitam que se encontre o que não se está procurando.
                                                                                                                     por Luan Reboredo

Nenhum comentário:

Postar um comentário